Eneagrama como processo

Eneagrama como processo

A palavra Processo tem sua raiz etimológica no latim procedere, que significa mover adiante, avançar.

Cedere significa ir e pro, quer dizer à frente. Processo diz respeito a um conjunto sequencial de ações a serem tomadas para se chegar a um objetivo.

Na tradição do Instituto Eneagrama Shalom a ideia de Processo é mãe, como os valores de transformação, libertação, partir da realidade das pessoas, participação, amorosidade, simplicidade… e outras, que nos vem das origens, inspiradas pela Espiritualidade, pela Educação Libertadora de Paulo Freire e pela Pedagogia de Carl Rogers. Daí nasceu o respeito profundo pela pessoa. O encantamento com o Eneagrama vem depois, pelo quanto se identifica com esse ideário. Junto com esse encantamento, vem o respeito pela tradição, como mapa psicoespiritual, integrando a Personalidade, a Essência e a Consciência.

Acreditamos hoje que conhecer as Personalidades do Eneagrama, corresponde a 10% desta tradição. Conhecendo os Instintos e Subtipos, acessamos mais 15% desta sabedoria. Os Caminhos das Asas e das Flechas, nos dão mais 25%. Os outros 50% tem a ver com experiências da Essência. Acredito que só isto seria suficiente para refrear qualquer desejo apressado de enfiar o Eneagrama goela abaixo, seja em quem for. Como seria possível devorar em dois dias uma verdadeira biblioteca da alma humana? Mas, mesmo que o fosse, o Eneagrama é para ser vivenciado, degustado, digerido e assimilado… e isso leva tempo. Gostaria de conseguir entender a habilidade, ou malabarismo ou, quem sabe, charlatanismo, que quem consegue, num treinamento de final de semana, apresentar o Eneagrama todo… e os participantes ainda saem de lá sendo especialistas e professores! Deve ter alguma mágica… que eu ainda não aprendi em vinte e quatro anos aprendendo, vivenciando e ensinando esta sabedoria. Antes pelo contrário, cada vez mais, sinto que o processo precisa de mais tempo, ao ponto de acreditar que ele dura, pelo menos, a vida inteira… em doses homeopáticas, para serem digeridas e assimiladas, lentamente, porque a vida é assim, do jeito que ela é, processual, lenta, sem queimar etapas. Diz Cláudio Naranjo que o Eneagrama é um supositório de efeito retardado. Que o efeito é lento… isso eu também tenho certeza! Efeito imediato tem o Rivotril e a Ritalina… e alguns treinamentos de final de semana – pelo menos isso é prometido por seus vendedores!

Lembro a parábola da borboleta. O menino que encontrou aquela borboleta querendo se libertar do casulo, tentando romper os fios. Sentiu compaixão pela borboleta aquele menino e tentou aliviar seu esforço e sofrimento, ajudando a romper os fios que a amarravam. Ficou feliz quando a borboleta enfim abriu as asas e as bateu… e logo morreu. Ele apressou o processo. Mesmo que tenha sido por compaixão. Tenho medo de overdoses, de Eneagrama também. Podem destruir, mais do que ajudar. As pessoas querem processos rápidos… e o perigo é a pessoa mesma, ficar para trás. Não apresse o rio. Ele tem o seu tempo. A ilusão das pílulas mágicas que prometem sucesso imediato e sem dor, a cultura do fast food pronto a consumir e sem tempo para mastigar, a ansiedade e a intolerância à angústia… destroem mais do constroem.

Vamos devagar com o andor porque o santo é de barro – dizia a minha mãe. E sendo de barro o santo a quem o Eneagrama propõe o processo de transformação e sendo poderoso o remédio que o Eneagrama é, todo o cuidado é pouco.

Tem aquela parábola do velho pároco do interior que preparou um sermão caprichado para a festa da padroeira naquela comunidade no meio da roça. Chegou empolgado… mas a hora passava e o povo não chegava. Meia dúzia de gatos pingados, apenas. Ficou decepcionado aquele padre e desabafou com o sacristão sua revolta e vontade de ir embora. O sacristão, homem sábio, falou assim: olhe seu padre, quem sou para dar lição, mas eu vou dizer para o senhor o que eu faço com os meus bois, pois é disso que eu entendo. Se eu vou botar comida aos meus bois e eles não aparecem todos para comer, eu não deixo de dar comida aos poucos que aparecerem. O padre reconsiderou e voltou e fez o sermão, com toda a empolgação, para aquela meia dúzia de gatos pingados que estavam na igreja. No final, na sacristia, o padre agradeceu àquele homem sábio e perguntou se tinha gostado do sermão. E de novo o sacristão esbanjou sua sabedoria: olhe seu padre, eu da minha parte, quando levo a comida para os meus bois e só alguns vem comer, eu não jogo a comida toda de uma vez só.

Sabemos da riqueza da sabedoria do Eneagrama. Não podemos reduzir ou mutilar a integralidade desta tradição. Costumo dizer que é preferível nem falar de Eneagrama se não tivermos possibilidade de acompanhar a pessoa até aos campos da Essência. No entanto, não precisamos jogar a comida toda logo no primeiro dia. Passo a passo, grão a grão. A cada dia basta a sua preocupação – diz o Evangelho. Talvez porque a preocupação de hoje, a gente dá conta de suportar, integrar e resolver… mas a de amanhã depois de amanhã, a gente não aguenta. O Eneagrama, como todo o processo sério de Autoconhecimento, mexe, dói, desestrutura… e se assim não for, desconfie do processo, ou de você. Não há transformação sem dor – falava Jung e, hoje, cada vez mais alto, é preciso repetir isso. Precisamos conhecer todos os degraus da escada e precisamos acompanhar a pessoa até chegar ao topo mas, sem pular degraus e sem queimar etapas. Overdose mata… de Eneagrama também. Já ouvi, diversas vezes, da boca de psicoterapeutas experientes, que o volume de descobertas que a pessoa faz na primeira etapa de Eneagrama – um final de semana de introdução a esta sabedoria, apenas com o objetivo de identificar o perfil de Personalidade, equivale a um ano e meio de terapia tradicional. Que coisa maravilhosa – poderiam alguns achar. Eu não acho nada… mas tenho certeza que, se essas descobertas não forem digeridas e assimiladas, de nada adiantou aquele final de semana. Desde o início da nossa caminhada, sempre achamos que era preciso dar um tempo entre a primeira e a segunda etapa no processo de Eneagrama. Um mês, pelo menos. Nunca abrimos mão disso.

A Lei do Sete nos lembra isso. Processo é crucial e só é se for consciente.

Que tal mudar a sua vida da noite para o dia?! Faça isso num curso de dois dias! – juro que li isso no anúncio de um treinamento de pretenso autoconhecimento e transformação pessoal. E quem fez a propaganda enganosa ainda não foi preso, me parece, embora isso seja crime.

Tenho medo de quem ainda não partiu e tenho medo de quem já chegou; eu acredito em quem está no caminho. Assim acredito. Quem ainda não partiu, está dormindo, acomodado ou satisfeito. Um dia poderá acordar e sentir necessidade de caminhar. Quem já chegou, ou melhor, quem acha que já chegou, provavelmente está enganado. A nossa condição é caminhar, sempre! Dizem que um anjo questionador implicou com Deus dizendo que a linha do horizonte, o infinito, não serve para nada e foi desnecessária a sua criação. Deus perguntou por que e o anjo respondeu: quando a gente dá um passo na sua direção, ela fica mais longe um passo… só serve para fazer a gente andar. Pois foi para isso mesmo que eu criei o Infinito – disse Deus, para fazer as pessoas darem passos, cada vez mais além.

Podemos dizer que o Infinito mora dentro de nós e nos desafia a irmos sempre mais além. Podemos talvez dizer também que o Eneagrama é mapa desse caminho no rumo do Infinito. Mas ao Infinito não se chega no primeiro passo e nem adianta querer dar os passos todos no mesmo dia. A vida inteira, pelo menos.

 

Processo diz respeito a um conjunto sequencial de ações a serem tomadas para se chegar a um objetivo. O objetivo é fundamental. Mas a sequência das ações também é importante.

Eneagrama precisa ser entendido, vivido e proposto, como um processo terapêutico. O objetivo é a transformação da pessoa e da humanidade. O conjunto sequencial de ações diz respeito a etapas ou fases a serem vivenciadas. Não apenas decoradas, lidas, devoradas ou despejadas goela abaixo nas pessoas.

Por respeito às pessoas, por respeito à tradição séria desta sabedoria.

Se é distorção e traição retalhar este mapa e vendê-lo aos pedaços, cada pedaço como se fosse o mapa todo, é certamente uma outra mentira querer botá-lo todo num pílula mágica a ser digerida num treinamento de final de semana.

Talvez essas pressas todas, ou as motivações inconscientes ou ocultas ou talvez indizíveis de quem assim apresenta o Eneagrama, justifiquem o reducionismo raso dos testes que impõe diagnósticos superficiais e roubam da pessoa a riqueza libertadora da autodescoberta… Talvez justifiquem também ou expliquem o inexplicável dos esteriótipos ou do folclore a que o Eneagrama tantas vezes é diminuído. Talvez esteja aí, quem sabe, o sucesso rápido e as promessas inflamadas dos gurus, que estão cada vez mais na moda e vendem caro ilusões para incautos ou desesperados, ou apenas pessoas de boa vontade que buscam, no desespero, horizontes de uma vida que tenha sentido. Talvez aí esteja o falso terreno fértil onde crescem modas mesquinhas de usar o Eneagrama para fazer seleção de pessoas, ou para arrumar relacionamentos que deem certo no princípio reality show de Televisão. Talvez isso seja útil, ou terrivelmente perigoso, nas mãos daquele diretor que anda com o papelzinho no bolso, onde tem as seis qualidades e os seis defeitos de cada tipo, para consultar antes de conversar com cada colaborador, que através de um teste foi rotulado de fora para dentro. Essa visão reducionista, simplória e assassina da tradição do Eneagrama – e, quem sabe, de pessoas também, serviu de motivação para aquele aluno que participou de um treinamento de Eneagrama no final de semana – uma introdução aos nove Tipos de Personalidade e, na segunda feira, já atualizou o seu curriculum na internet acrescentando: especialista em Eneagrama. Esse, nem leu a orelha do livro e já virou especialista, autoproclamado.

Processo. Processo terapêutico. Como dizia Jung, o Terapeuta só leva o paciente até onde ele mesmo chegou. Degraus na escada. É preciso subir a escada muitas vezes, para poder acompanhar alguém na subida. É preciso conhecer cada degrau, saber o que vem pela frente e o que tem lá no topo. E é preciso caminhar, degrau por degrau, sem queimar etapas e sem pressa de chegar. A chegada é importante, mas a jornada é mais importante.

 

Um projeto de um Processo com o mapa do Eneagrama

O primeiro passo é apresentar o Mapa. O mapa todo que a tradição nos dá. Personalidade e Essência. Proposta de crescimento-trasnformação pessoal e relacionamento interpessoal. Instrumento de compaixão, por si mesmo e pelos outros. Um caminho de Consciência e responsabilidade pessoal, da Personalidade à Essência, através da Consciência. A viagem é para dentro e o caminho é pelas sombras.

O segundo passo é entrar em contato com os Tipos de Personalidade e identificar-acolher-aceitar o seu padrão de comportamento predominante. Autodescoberta. De dentro para fora. Cada pessoa é sujeito desse processo. O Terapeuta é apenas um recurso e um criador de situações, sem substituir a pessoa. A única pessoa capaz de identificar seu Tipo de Personalidade no Eneagrama, é a própria pessoa. Não rotule, nem se deixe rotular. Esqueça testes, por melhores que eles sejam. Mergulhe em si mesmo, investigue, cave cada vez mais fundo… por mais angustiante que isso seja. Tem luz, aí. Não apenas no final do túnel. Acredite: a luz está no túnel. E depois acolha, aceite. Deixe de se culpar por ser do jeito que é. Deixe de lutar contra você. Abrace as suas sombras e aprenda a rir de você mesmo e das suas mancadas. Fale delas! – melhor ainda. Isto demora um tempinho. Não tenha pressa. Quem se identificou e se acolheu do jeito que é, já foi longe neste caminho. Mas, Roma e Pavia não foram feitas num dia – imagine o Ser Humano, construção bem mais complexa e obra prima bem maior!

O terceiro passo pode e deve proporcionar a experiência dos Instintos e Subtipos. Estamos ainda percorrendo caminhos no mapa da Personalidade. É preciso fazer uma boa parada neste lugar de nós mesmos. Se a Personalidade tem muita influência na nossa vida e ajuda a entender muita coisa dos nossos comportamentos, habilidades e sombras a serem iluminadas… imagine a força que os Instintos exercem, sobretudo nos relacionamentos e na vida profissional, mas em tudo, tudo mesmo da nossa vida. Se a Personalidade, que tem mais ou menos a idade da nossa vida, já é uma fonte tão intensa de energia, avalie a energia que os Instintos carregam, com sua história de milhões de anos acumulando estratégias de sobrevivência de todos os seres vivos, ao longo da grande caminhada da evolução, como assinatura de Deus no Universo que conspira a favor do bem, da paz e da vida em abundância.

O quarto passo encaminha os passos nos caminhos de crescimento. Personalidade e Instintos nos ajudaram a perceber onde estamos. Entendemos também de onde viemos e como chegamos até aqui, nesta terra de exílio. Tomamos Consciência da estagnação onde nos acomodamos e do preço que pagamos por ela. Agora é preciso sair da estagnação e recuperar o movimento, a natureza da nossa natureza, o fluxo, o fluir sagrado da Essência. Porque pensávamos que éramos pó, mas agora descobrimos que somos Sopro – como dizia Rumi. Sair da estagnação e entrar no fluxo da vida, seguindo as Leis Sagradas que regem o Universo. Assim flexibilizamos os padrões rígidos e as crenças limitantes da Personalidade. O Eneagrama nos propõe, como atalhos, o movimento das Asas e das Flechas. A volta ao Uno. Assim começamos a experimentar-saborear a Essência, deixando-nos encantar e seduzir por ela, como a volta ao primeiro amor. Este trabalho urge que seja vivencial. No símbolo, entrando em contato, de modo sensorial e emocional, com as trilhas ou fluxos por onde corre a vida, no firmamento dos céus, em toda a Natureza e dentro de nós e entre nós, porque Somos Todos Um, com tudo e com todos. Aqui, novamente, precisamos de tempo. Tempo para experienciar, perceber as sensações físicas e as emoções, saborear, tomar consciência do movimento em nós e de nós no movimento, no fluxo da vida, saindo da estagnação e seguindo as Leis que nos recolocam em sintonia com o pulsar do Universo. E precisamos de tempo também e sobretudo, para experienciar isso no dia a dia, percebendo onde estamos e fazendo conscientemente o caminho da Flecha de Segurança e o balanço pelas Asas. Se aprendermos, no dia a dia a perceber e identificar onde estamos e para onde podemos caminhar conscientemente, no atalho das Asas e/ou das Flechas, teremos encontrado realmente o segredo do equilíbrio emocional, a estratégia para evitarmos o estrago que a estagnação e o estresse geram em nós e poderemos saborear, lenta e progressivamente, a nossa Essência.

O quinto passo, há de levar-nos aos umbrais da Essência, para vislumbrar o melhor de nós mesmos, a natureza da nossa natureza, a fonte de onde vimos e para onde vamos, Aquele em quem nós somos, nos movemos e existimos, aquele espaço onde Deus nos habita. Vislumbrar, sentir o cheiro, saborear, curtir, deixar-se tomar e transformar. Aquietai- vos e sabei que eu sou Deus – diz o Salmo. Aquietar-se… parar de lutar, ficar quieto, relaxar. Aqui começa verdadeiramente a jornada espiritual. Até aqui foi esforço humano, trabalho nosso, exercício de tomada de consciência, disciplina pessoal, ascese. Tudo isso nos trouxe até aqui e esse trabalho é tarefa nossa. Nem Deus fará isso por nós e quando assim o queremos, caímos na alienação espiritual porque, como dizia Pascal, espiritualidade sem Autoconhecimento gera alienação. Mas também, dizia ainda o mesmo filósofo, Autoconhecimento sem Espiritualidade, pode levar ao desespero. Por isso, o Autoconhecimento, tem sua autenticidade confirmada quando nos leva até aos portais da Essência e nos coloca de frente para o Mistério que nos habita. Dizia Tomás de Aquino: quanto mais eu vou ao encontro de mim, mais descubro dentro de mim um Outro, que não sou eu, mas que, no entanto, é o fundamento do meu existir.

A partir daqui… não há mais passos. Chegamos ao Encontro. O encontro com o nosso Infinito Interior. A partir de agora… não há mais o que fazer… mas apenas deixar que Deus faça. Deixar Deus ser Deus. Deixar-se encontrar, abraçar e surpreender por Deus, no lugar onde Ele nos habita: no mais profundo de nós mesmos. Não precisamos mais caminhar, porque chegamos ao Infinito, assim como os peregrinos de Santiago de Compostela que vão até Finisterra e aí deixam o calçado sobre as pedras, junto ao mar, porque chegaram ao fim do seu mundo pessoal e encontraram o Infinito… e aí também queimam as roupas da caminhada, porque se desnudam perante o Absoluto que os acolhe e os reveste…porque somos seres de amor, de luz, de paz. A partir do Encontro com a Essência, a única coisa a ser feita ou cultivada é permanecer, estar no centro – in medium statio, Meditação. Aqui terminam as técnicas e os mapas, aqui cessam gurus – embora a tentação de alguns é quererem começar a ser gurus justamente aqui. A partir de agora, Deus assume. Por isso, aqui se torna necessária a abertura à experiência espiritual. E cada pessoa, de acordo com sua tradição religiosa ou a sua busca por ela, vai encontrar os seus caminhos. Na casa de meu Pai há muitas moradas – dizia Jesus. E se há muitas moradas, muitos são também os caminhos e cada pessoa há de encontrar o seu. Urge buscá-lo, experienciá-lo e assim seguir. É mais seguro, creio eu, que se busquem esses caminhos nas grandes tradições espirituais, consolidadas em cada cultura, ao longo de milhares de anos. Porque, se é perigoso andar sem mapas seguros pelos caminhos do autoconhecimento, é mais perigoso ainda, ou até pantanoso, percorrer os caminhos da espiritualidade sem termos referenciais seguros – facilmente podemos nos perder em devaneios histéricos, arrebatações – mais teatrais que espirituais, ou ilusões de falsos estados de iluminação onde, na realidade, a única coisa que brilha é o Ego. Ou então, não sei o que será pior e mais trágico ainda, nos deixamos seduzir por gurus da moda, seguimos a onda das religiões do bem estar que a New Age vende pelo cartão de crédito em suaves prestações… ou tomamos uns chás que possibilitam umas viagens legais, que alguém inventou chamar de experiências espirituais.

Ouso aqui trazer de novo a Meditação como caminho espiritual. Por ser comum a todas as grandes tradições religiosas, por ser simples e acessível a todos, pelos benefícios profundos que as ciências hoje lhe comprovam e pela profundidade espiritual que permite experimentar… e porque, fundamentalmente, é um caminho que só você e você só, pode fazer como experiência pessoal amorosa de Deus – e Espiritualidade é isso!

 

A que podemos comparar o Processo de Eneagrama?

Podemos compará-lo a uma viagem turística. Tem turista que quer conhecer muitas cidades ou países em poucos dias e já volta arrotando caviar como especialista das culturas que visitou. Não parou nas praças e não sentou para conversar com as pessoas, não sentiu o sabor das frutas e nem teve tempo de saborear as comidas típicas. Não conheceu a história de cada povo.  Mas virou expert autoproclamado. Visitou tudo, mas não conhece nada.  Tem pior ainda: lembro daquele jovem norte-americano que, em visita ao Brasil foi convidado a conhecer o Rio de Janeiro e respondeu: não precisa; já vi no vídeo.

Podemos comparar o Eneagrama a uma viagem turística dentro de nós mesmos. É preciso tempo. E quem se propõe como guia turístico, precisa conhecer todos os pontos turísticos, mas não pode querer que o turista visite todos no mesmo dia. E precisa ter um roteiro, para ajudar o turista a aproveitar o máximo, mas sem cansar logo ou enjoar de passear.

A que podemos comparar o Processo de Eneagrama?

Podemos compará-lo a uma viagem turística, talvez a mais importante que podemos e somos convidados a fazer. Com o mapa na mão, passo a passo, idas e vindas, errando caminhos e atalhos e voltando e de novo percebendo onde estamos. Sentir o cheiro de cada esquina e sentar em cada praça. E respirar. E conhecer a história e ouvir as estórias. E saber onde se quer chegar. E caminhar… sempre.

Acredito que um bom guia sabe dizer ao turista os pontos de interesse que tem na cidade. Não quer dizer que o turista os visite todos no mesmo dia ou por todos se interesse. Convém também que o bom guia tenha um roteiro para acompanhar o turista e facilitar as visitas. Mas o turista precisa caminhar. Não seria turista de verdade se o guia lhe mostrasse na internet as imagens da cidade e ele ficasse satisfeito com isso.

Acredito que o Eneagrama precisa ser proposto assim. Uma visão panorâmica da cidade com a menção dos principais pontos turísticos. E depois, passo a passo, fazer caminho pelas ruas da cidade interior que somos. Mostrar o mapa todo, logo no início, mas depois dividi-lo em etapas a serem percorridas pelo alcance das pernas, de cada um. E não misture as histórias e as estórias dos vários pontos turísticos. Um de cada vez, visitado, saboreado, sentido. Embora todos estejam na mesma cidade.

Um bom guia turístico talvez seja aquele que ajuda a pessoa a chegar onde ela quer chegar. Ou aquele que tem clareza de um conjunto sequencial de ações a serem tomadas para se chegar a um objetivo.

Mas, lembre: não queira ter o título de cidadão honorário de uma cidade, sem a ter visitado. E não invente de ser guia turístico de um território que vc nunca visitou… ou só conhece pela internet.  Não tenha medo de crescer devagar – tenha medo apenas de ficar parado e não coloque o carro na frente dos bois, nem queria dar um passo maior que as suas pernas. Dizem que a excelência do piloto é confirmada pelas suas horas de voo. Queira que a sua maturidade seja assim também, sustentada por muitas horas de voo pelos céus – e infernos, do seu Infinito Interior. Quem está de pé cuide para não cair e quem caiu trate de se levantar – dizia o Apóstolo Paulo. E nunca esqueça que o mais importante não é o lugar do processo em que você está, mas sim saber onde está, ter Consciência. Consciencia, no latim, faz referência a senso íntimo, de conscire – estar ciente, estar sentindo, estar saboreando, enxergar a sua própria presença no mundo, ser testemunha secreta da alma, percepção da própria experiência.  Con-sciencia é estar no presente, aqui e agora, inteiro, saborear o presente, estar com sciencia, permanecer com sciencia. E esta sciencia, que vem de sciens, é de sentir o sabor, saborear – e não de saber racional, de conhecimentos intelectuais.